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quinta-feira, 28 de abril de 2011

Réplicas, mitos e superstições de nossa infância




Réplicas são certas expressões de uso frequente na linguagem cotidiana. Tem complementos rimados ou respostas que fazem parte do repertório infantil. São exclamações com respostas de caráter malcriado e zombeteiro. 








Que há de novo?
Muita galinha e pouco ovo.


O negócio é o seguinte...
Dezenove não são vinte.


Nunca me viu, cara de pavio?
Sua mãe morreu e seu pai não viu.


Sempre te vejo, cara de percevejo!


Tá com frio, bate a mão no rio!


Tá com calor, bate a mão no tambor.


Cala a boca!
- Cala a boca já morreu. Quem manda aqui sou eu


- Quem manda na minha boca sou eu
- Quem manda agora sou eu


Tá com mágoa? - Bebe água.


Tô de mal. - Come sal.
Deixa um pouco para o natal
Lá na porta do hospital


Tô de bem. - Parabéns


Quem cochicha, o rabo espicha.


Bem feito!
Seu nariz está com defeito.


Me dá um martelo que eu endireito.
Vai na casa do prefeito que ele dá um jeito.




Que fome!
- Tá com fome? Vai à rua do João, mata um homem e come.
- Mata um homem e come.


Fonte de pesquisa:
http://www.edukbr.com.br/kiagito/dias_de_chuva/janela_replicas.asp






"Meio dia, macaco assobia, fazendo careta prá dona Maria"










Minha infância foi povoada de mitos e superstições. Igual a de todo mundo.
Quando chovia, minha mãe cobria todos os espelhos, escondia todos os metais, inclusive tesouras e talheres. Dizia que o brilho atraía raios. E, tudo escondido, nos amontoávamos, eu, ela e meu irmão, em cima da cama e rezávamos para Santa Bárbara, São Gerônimo, se vestiu e se calçou, seu caminho caminhou, com Jesus Cristo encontrou, onde vai, Bárbara Virgem (?), vou a casa do Senhor para pedir-vos que abrandem esses trovões e esses relâmpagos.
Almoçar e cortar o cabelo, só três horas depois. Brincar de ficar vesgo, de jeito nenhum. Podia ficar vesgo para sempre. Injeção, só em jejum absoluto e manga com leite, decididamente, fazia muito mal. Isso sem falar que, olhar no espelho depois do almoço, podia entortar o rosto.
Tinha mais. Se roesse as unhas, podia ter que operar o apêndice. E a admoestação vinha acompanhada de uma história em que a filha da Fulana de Tal, quando operou de apendicite, encontraram o órgão preto de pedaços de unhas. Dor de garganta curava com vick vaporub e lenço embebido em álcool em volta do pescoço, susto passava com água com açúcar e o dente de leite era trocado por moedinhas, mágica de um ratinho, desde que fosse colocado debaixo do travesseiro na hora de dormir.
Na quaresma não podia pensar em música de carnaval, o que era uma observação inútil, já que as marchinhas não saiam da cabeça e, todo dia, às seis da tarde, tinha que parar onde estivesse para ouvir os sinos da Ave-Maria.
Mas tinha a outra parte, a que, em todo meio dia, alguém tinha que declamar “meio-dia, macaco assobia fazendo careta pra dona Maria” ou, a qualquer hora, se tinha que contar uma história, sempre começava com “era uma vez um gato xadrez”, que não era o único bicho com que convivíamos. Tinha a vaca do silêncio, “vaca amarela pulou a janela, fez cocô na panela, quem falar primeiro come todo o cocô dela”. E se perdesse alguma coisa, “São Longuinho, São Longuinho, me ajuda a achar a chave que eu dou três pulinhos”. Sem contar que, sempre que começava a escurecer, “primeira estrela que eu vejo, dá-me, Deus, o meu desejo”, desejo este que era sempre saúde pra todos da família e, se não fosse abusar, um pouco de dinheiro caía bem.
Na cozinha, eram os panos de prato que davam seus recados: “quando em seu coração reina a paz, a menor casa num palácio se faz”. E na sala, os quadrinhos pregados na parede não deixavam por menos: “seja como o sândalo que perfuma o machado que o fere”.
Para escolher, na hora dos jogos, tinha o pontanetapitapita, peta pe ruge, pontanetapitapita, peta petrim. Ou um tal de copo de veneno que ficava em cima do piano, quem bebeu morreu, graças a Deus que não fui eu, tudo declamado com o ritmo marcado, sílaba por sílaba.
Quem cochicha o rabo espicha, quem dá e torna tirar no inferno vai parar, palavra de rei não volta atrás, nunca viu, cara de pavio, sua mãe fugiu, seu pai não viu, cadê o toucinho que estava aqui, de quem você gosta mais, do papai ou da mamãe…
Se olhasse, Santa Luzia furava os olhos, se tossisse, São Braz, que na panela tem mais, vinha socorrer e se espirrasse, eu não falei pra você não ir lá fora sem pulôver que tomava um golpe de ar? Visita demorada? Poe a vassoura atrás da porta. Chuva que não para mais, põe um ovo em cima da cerca pra Santa Clara.
Eu cresci sem saber por que a porca torcia o rabo, eu, que tinha cara de cuíca e que jamais descobri com quantos paus de faz uma canoa. Apesar de ser um bunda-suja, pra minha mãe, esta parte da anatomia se chamava pandeiro ou foxtrote, que palavrão desgostava o Nosso Senhor que vigiava do alto de um quadro na sala de visita com os dedos indicando que o mundo passaria dos mil, mas não chegaria aos dois mil.
Cresci e o mundo não só passou dos dois mil como já venceu a primeira década do novo milênio. Mas cada vez que a televisão mostra as enchentes deste verão, dá uma vontade danada de chamar Santa Bárbara, São Gerônimo. De repente, funciona outra vez.
E acabou-se a história, morreu a vitória, quem quiser que conte outra.


http://www.sergioantunes.com.br/cronicas/m

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